"“O direito do trabalho não se esgota na regência das obrigações tipicamente trabalhistas”"

O ministro do Tribunal Superior do Trabalho Augusto César Leite de Carvalho, que fará a conferência de encerramento do XVIII CNPT, faz um balanço sobre o direito do trabalho no Brasil e ressalta a importância do Ministério Público como promotor dos direitos sociais. Confira. "( Como avalia a atuação judicial e extrajudicial do MPT e como ela contribui, em sua visão, para a concretização dos direitos sociais? ) Parece-me que o MPT investiu-se, desde a Carta de 1988, da responsabilidade de agir quando o drama social revela-se consequente de lesões difusas, sofridas por cidadãos sem rosto ou coragem, que não teriam como afrontar o poder político ou econômico cuja atuação os afl ige. Uma ordem jurídica garantista não pode prescindir da atuação do Ministério Público, portanto. E o MPT tem agido com maturidade no manejo de inquéritos e ações civis públicas que servem ao resgate dos direitos da personalidade, direitos sociais e ambientais que de outro modo estariam relegados ao limbo do esquecimento, perpetuando-se a injustiça no mundo do trabalho. ( Tem sido observada, ao longo dos últimos anos, uma tendência de alteração da jurisprudência do TST, inclusive do conteúdo histórico de algumas de suas Súmulas e OJ´s. Como analisa essa tendência e quais seriam, em sua opinião, as suas causas e efeitos? ) Uma Corte judicial cuja missão seja a uniformização da jurisprudência não poderá descurar-se de duas funções primordiais: decidir com a uniformidade possível e viabilizar a revisão periódica dos fundamentos da jurisprudência que já consolidou. Por que essa segunda tarefa? Porque a dinâmica e a intensidade dos julgamentos, no TST, nem sempre permitem a evolução natural de sua jurisprudência, seguindo-se o pensamento firmado há muitos anos. As últimas décadas, no Brasil, assistiram à eclosão de direitos fundamentais e princípios constitucionais com inegável força normativa, bem assim aoadvento de um Código Civil repleto de cláusulas gerais que conferem discricionariedade à jurisdição, com ênfase ainda para o princípio da boa-fé objetiva e seus desdobramentos nas relações laborais. Várias leis mudaram ou surgiram. Os tribunais regionais e a doutrina têm dado contribuições valiosas em razão dessas mutações normativas. Enfim, a tarefa de uniformizar a jurisprudência não pode signifi car o seu engessamento. ( No seu ponto de vista, como o Direito do Trabalho pode contribuir para dar maior efetividade à promoção do direitos Humanos? ) O direito do trabalho não se esgota na regência das obrigações tipicamente trabalhistas e há, conforme se extraido art. 7º da Constituição, obrigações de direito do trabalho que equivalem a direitos sociais, ou seja, a direitos fundamentais. É sempre bom considerar que os direitos fundamentais são, em princípio, direitos humanos que se constitucionalizaram. Os direitos de liberdade, vários direitos sociais que sequer se revestem de índole laboral e mesmo o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado são direitos humanos, atualmente convertidos em direitos fundamentais, que se realizam também no ambiente de trabalho. ( Divulga-se que o Brasil tem avançado na busca pela erradicação do trabalho escravo. Em sua opinião, o que ainda precisa evoluir para que sejam alcançados melhores resultados? ) Não há dúvida de que o protagonismo do Brasil no combate ao trabalho forçado deve-se sobremodo à atuação do Grupo Móvel integrado, para esse fi m, pelo MP e pelo MTE. Seja no campo ou nos recantos das cidades onde os contratos de facção promovem trabalho em condições precárias, a ação preventiva é fundamental. Há ainda, a respeito, uma importante mudança cultural que se promove mediante a melhor regulamentação do trabalho rural (NR 30 MTE). Penso, em suma, que o ato ilícito é inibido se a sanção jurídica imposta é realmente proporcional à ofensa. Agrada-me, por exemplo, o movimento político que pretende viabilizar a desapropriação das terras onde se constate o trabalho. Não é possível transigir nesse tema. ( Na condição de professor, como observa a visão que os acadêmicos têm a respeito do Direito do Trabalho? E a sociedade em geral, como vê tal ramo do direito? ) O ambiente acadêmico já foi mais refratário à relevância social do direito do trabalho. Sou professor da disciplina há mais de quinze anos e não me ressinto de alunos que revelem desapreço ao direito do trabalho, bem ao contrário. Às vezes noto, desafortunadamente, alguma incompreensão de colegas do magistério, que ao desdenharem a importância do direito do trabalho não disfarçam, em verdade, o fato de que discriminam o próprio trabalho. Tenho certeza de que a valorização do direito do trabalho será sempre maior se aqueles que têm a missão de promovê- -lo, como advogados, procuradores ou juízes, estiverem conscientes de sua importância e vocacionados para a difícil tarefa de tornar mais justa ou equânime a relação entre o capital e o trabalho."

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