“O racismo opera como importante fator da inércia social”

Ministra de Estado chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) acredita que atuação conjunta com procuradores do Trabalho gera bons frutos no combate à discriminação
Quais os maiores problemas enfrentados, atualmente, no combate à discriminação no Brasil?
No que tange ao combate à discriminação racial, penso que o maior problema reside na dificuldade em delimitar exatamente as razões e a origem dessa discriminação. Em outras palavras, é preciso reconhecer que a discriminação tem uma raiz histórica no escravismo e se baseia na vigência do racismo. O combate às desigualdades raciais, ao preconceito e à discriminação deve ter como foco o enfrentamento do racismo, que delineia na sociedade uma visão que estereotipa capacidades e atributos de cada cidadão, culminando no cerceamento às oportunidades que lhe devem ser oferecidas. E ao se configurar como efetivo entrave à possibilidade de ascensão social da população negra, o racismo opera como importante fator da inércia social, naturalizando a existência da desigualdade em qualquer de suas dimensões e reforçando a reprodução da pobreza e da miséria.

Em recente palestra proferida para procuradores do Trabalho de todo o país, o Secretário Executivo da Seppir, Mário Lisboa Teodoro, comentou que a sociedade está “viciada na desigualdade”. Como e por que isso acontece?
Uma das principais características de uma sociedade moderna e desigual, caso do Brasil, é a profusão de pessoas ofertando serviços pessoais. Nas ruas, nas residências, há um contingente enorme que não tem nada mais a oferecer além de seus serviços pessoais. A classe média depende dos serviços das domésticas, os guardadores de automóvel são fundamentais, e assim observamos que o país funciona em grande parte graças a esses trabalhadores, em sua maior parte, informais. Há uma verdadeira dependência dos serviços pessoais, que em última análise, proliferam em ambiente de desigualdade extrema. Daí a menção à imagem de uma sociedade “viciada na desigualdade”.

Quais são as principais políticas de promoção da igualdade racial atualmente adotadas no combate à discriminação no mundo do trabalho, na fase de contratação e no próprio curso da relação laboral?
De fato, em andamento temos pouca coisa, programas residuais. Mas nós estamos finalizando, no âmbito da Seppir, um grande programa de ação afirmativa, com base nos dispositivos legais do Estatuto da Igualdade Racial, que, no que se refere ao mundo do trabalho, prevê ações de estímulo ao emprego de trabalhadores negros, bem como a destinação de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para projetos de geração de emprego e renda e de capacitação para trabalhadores negros. O que se pretende é eliminar o diferencial de rendimentos e de ocupação existente hoje entre negros e brancos. Segundo cálculos do Ipea, cerca de 40% do diferencial de renda entre esses dois grupos é explicado pelo racismo.

No que tange à atuação dos procuradores do Trabalho, em cujo rol de atribuições está a de zelar pela não discriminação nas relações trabalhistas, quais destacaria, em tal seara, como mais relevantes?
Há uma gama extensa de possibilidades de ação conjunta. O mercado de trabalho brasileiro é gigantesco, abrigando cerca de cem milhões de trabalhadores. Há uma diversidade de situações que ferem a legislação trabalhista e agora também o Estatuto da Igualdade Racial (instituído pela Lei n.º 12.288, de 20 de julho de 2010). Trabalhadores negros são discriminados, preteridos em função de sua cor, alijados de programas de treinamento, têm baixíssimos índices de ascensão nas empresas, tudo isso em função do racismo. O MPT tem realizado um extraordinário junto a alguns segmentos importantes. Cito o caso dos bancos, instados pelo MPT a observar a clivagem racial em suas contratações, o que levou à elaboração de um programa interno de valorização da diversidade racial e de gênero dentro da rede bancária. Há ainda o caso dos supermercados e muitos outros, que deverão seguir um mesmo caminho.

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