Italianos defendem norma internacional para luta contra o amianto no mundo

O maior processo judicial do continente europeu sobre o amianto, movido pelas vítimas do amianto da cidade de Casale Monferrato, na Itália, foi tema de um dos painéis do “Seminário Internacional Amianto e seus Males: uma abordagem sócio-jurídica”, evento que a ANPT promove conjuntamente com a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) até amanhã (31/8) em Brasília. "O painel “O Processo de Turim e seus pressupostos jurídicos: etapas da luta jurídica em favor das vítimas do amianto na Itália” reuniu o advogado das vítimas do processo em Turim, Sergio Bonetto, e Bruno Pesco, representante da Associação dos Familiares e Vítimas do Amianto em Casale Monferrato e organizador do livro “La Lana della Salamandra”, cuja versão em Língua Portuguesa foi lançada no evento. A mesa foi presidida pela diretora da Anamatra, Carla Leal. Sergio Bonetto falou das particularidades jurídicas do processo, entre as quais o fato de os crimes “normais” cometidos no âmbito da exploração do amianto, quais sejam os homicídios e ferimentos culposos, não serem objeto de contestação no caso. Segundo ele, os dois grandes objetos da ação são o desastre culposo e a omissão culposa de medidas de segurança. “Há duas normas no Código Penal italiano que não se preocupam diretamente com as lesões averiguadas na saúde das pessoas, mas sim perseguem aqueles que colocam em risco a coletividade”, explicou. Bonetto também relatou o esforço da Procuradoria da República na Itália, que culminou no processo movido contra a Eternit. Nesse ponto, o advogado ressaltou a reconstrução de centenas de milhares de páginas de documentos do processo, pesquisas sobre o grupo Eternit, além de interrogatórios levados a cabo entre as pessoas envolvidas. “Chegou-se à conclusão que aquela empresa, mesmo conhecendo perfeitamente o risco ao qual expunha os trabalhadores, familiares e moradores das áreas próximas à exploração do amianto, continuava trabalhando com o mineral”, informou. Segundo o advogado, o desastre do amianto, mais especificamente da Eternit, deve ser interpretado como sendo de nível mundial, pois ainda acontece em países como a China, Índia e Peru. “O grande elemento dessa questão é saber que existe um altíssimo número de partes lesadas conscientemente. Se não fosse a mobilização dos trabalhadores italianos no caso, seriam apenas casos de homicídio levados um por um ao Judiciário. A consciência coletiva fez com que nascesse um processo coletivo, com três mil pessoas envolvidas, e de interesse comum”, disse. Para Bonetto, processos como esse podem existir em outros países, desde que haja uma “atenção civil pública grande”. “Só uma forte pressão social consegue colocar tal força em andamento. Reconhecer a realidade é a base para iniciar esses processos. Espero que o nosso trabalho e o exemplo de outros países colaborem para que possamos chegar à superação do amianto. E não podemos superar o amianto se não criarmos justiça, porque o fenômeno de desastres industriais não se limita ao mineral. O conceito de desastre deveria ser afirmado positivamente como uma norma internacional a ser perpetuada. Não se pode pensar em reproduzir outros casos com populações não preparadas e nenhuma norma internacional que permita ajudar na defesa das vítimas”, afirmou o advogado. Em sua intervenção Bruno Pesce falou da dimensão do caso Eternit na Itália. “A Eternit provocou um desastre dentro e fora das fábricas”, disse, ao ressaltar que dentre os cerca de 1.200 casos de morte por exposição ao amianto na Itália, muitos ocorrem na população em geral, e não diretamente nos trabalhadores que lidam com o mineral. O lobby empresarial dos defensores do uso seguro do amianto também foi abordado por Pesce, que relatou a publicação de anúncios em jornais italianos, nos quais a empresa denunciava que havia uma tentativa de influenciar o Parlamento, colocando em risco cerca de 4 mil empregos. “Em todos os lugares isso se repete”, afirmou. Pesce também defendeu um papel ativo dos órgãos internacionais no que tange o banimento do amianto no mundo. “É preciso afirmar a certeza de empreendermos ações legais e simplificar as normas de investigação, mecanismos processuais de ressarcimento, entre outros. Acreditamos que o processo contra a cúpula da Eternit possa representar um empurrão que venha a mostrar ao mundo os enormes absurdos do lucro fácil advindo da exploração do mineral e sempre com graves consequências à vida dos trabalhadores”, disse."