O diretor de assuntos legislativos da Associação Nacional dos Procuradores e Procuradoras do Trabalho (ANPT), Tiago Ranieri de Oliveira, participou na tarde dessa terça-feira (17), de uma live promovida pelo Programa de Equidade de Raça, Gênero e Diversidade da Justiça do Trabalho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A atividade aconteceu em alusão ao Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, comemorado em 28 de junho.
O evento teve como principal objetivo esclarecer à população os direitos das pessoas LGBTQIA+ no ambiente de trabalho e debater estratégias eficazes para combater o preconceito e a discriminação, tanto em espaços públicos quanto privados. A iniciativa busca ainda promover a inclusão e a diversidade, fomentar o letramento sobre conceitos fundamentais relacionados à diversidade sexual e de gênero, e incentivar a construção de ambientes mais respeitosos e igualitários.
Em sua fala, o procurador Tiago Ranieri de Oliveira trouxe uma perspectiva pessoal e incisiva sobre a necessidade de ir além da mera compreensão da violência sofrida pela comunidade LGBTQIA+. Referindo-se à escritora americana negra, feminista e lésbica da década de 50 Audre Lorde, ele destacou a importância de se autodefinir para não ser "esmagado pelas fantasias que outras pessoas fazem de mim". Ele mencionou um "letramento" recebido em 2017 que o fez tomar consciência de sua responsabilidade social, dada sua posição de privilégio como procurador do Trabalho.
Provocativo, o diretor da ANPT citou Michel Foucault, afirmando que "o saber não é feito para compreender, o saber é feito para cortar". Para ele, as informações sobre as violências que a população LGBTQIA+ sofre diariamente não devem ser apenas compreendidas, mas devem gerar um "corte" – uma dor física, ontológica - na construção do ser - e epistemológica no modo de pesquisa, que leve à ação. "Nós, como operadores do mundo jurídico e que integramos o sistema de justiça, temos que sentir uma dor física quando sabemos que houve uma discriminação apenas porque aquela pessoa carrega um marcador social, apenas porque aquela pessoa é uma pessoa trans", ressaltou.
Educação, Cotas e o Projeto "Mais Um Sem Dor"
O diretor da ANPT fez um paralelo com Judith Butler, ao afirmar que "gênero nada mais é do que performance", e defendeu que a educação e as qualificações em todos os setores são fundamentais para que a diversidade seja naturalizada e potencializada.
Ele enfatizou a necessidade de o Estado brasileiro incluir a orientação sexual e identidade de gênero nos censos oficiais para que se possa, de fato, pensar em políticas públicas efetivas para essa população. "Não há como se pensar em políticas públicas se não sabemos onde estão as pessoas LGBT no nosso país", pontuou.
O procurador apresentou o projeto "Mais Um Sem Dor", idealizado a partir do seu próprio letramento. Iniciado em 2018 com foco na população trans, o projeto visa a formação humana e qualificação técnica, além do encaminhamento ao mercado de trabalho formal, qualificando também as empresas para que não sejam mais um dispositivo de discriminação. O projeto já acolheu diretamente mais de 4 mil pessoas e indiretamente mais de 12 mil, com investimentos de cerca de R$ 10 milhões em condenações e multas. "É muito pequeno ainda o projeto, mas ele prova para o Estado brasileiro que é possível pensar em políticas públicas para naturalização e potencialização da diversidade", destacou.
Representatividade e Orgulho de Resistência
Tiago Ranieri de Oliveira defendeu veementemente a necessidade de a diversidade ocupar todos os espaços de poder, especialmente o legislativo. Ele observou que, no Congresso Nacional, "dificilmente essa diversidade vai ser naturalizada e potencializada se naquele espaço onde são criadas as leis, não existe representatividade".
Para o diretor da ANPT, o "orgulho" no mês de junho significa estar vivo aos 46 anos em uma estrutura "Patriracialcapacitalista", termo cunhado por Márcia Tiburi. Essa estrutura, segundo ele, é patriarcal (com misoginia, machismo e sexismo), racista e capacitista. Ele enfatizou a importância de desconstruir os "marcadores sociais" que fazem com que as pessoas sejam vistas primeiramente por eles e não como seres humanos com suas potencialidades.
Ele clamou por cotas para pessoas trans e LGBTQIA+ em contratos terceirizados, de aprendizes, de estágios e de concursos públicos, citando o avanço já existente para pessoas trans no concurso de membros(a) do Ministério Público do Trabalho. Ranieri finalizou sua participação convidando a audiência a sentir um desconforto que gere questionamento sobre a estrutura social vigente e incentivou o capitalismo a ter um "viés social", incluindo os corpos dissidentes em todas as suas estruturas, ressaltando a importância de construir uma sociedade solidária e fraterna, conforme a Constituição Federal de 1988.