O presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Ângelo Fabiano Farias da Costa, falou sobre os impactos da reforma trabalhista na execução nesta sexta-feira, 08/06, durante o II Encontro de Advogados, Juízes e Membros do Ministério Público que atuam na Justiça do Trabalho. O evento foi promovido pela Associação dos Advogados Trabalhistas do Distrito Federal (AATDF), em Brasília, e contou com diversos painéis ao longo do dia. Outros membros do MPT também foram palestrantes, entre eles a diretora social e de eventos da ANPT, Ana Cláudia Bandeira Monteiro. Ela falou sobre “Questões controvertidas sobre a jornada de trabalho e o intervalo intrajornada – o confronto do negociado com o legislado”.
Em sua manifestação, Farias da Costa destacou que a entidade acompanhou desde o início a tramitação do Projeto de Lei que tratava da chamada reforma trabalhista. Ele lembrou que as audiências públicas no Congresso Nacional para tratar do assunto foram, segundo o procurador, para passar a falsa impressão de que se estava ouvindo a sociedade, tendo sido realizadas sob a ótica do PL 6787/2016, que até então modifica tão somente sete artigos da Consolidação das Leis do Trabalho, “porém, não houve qualquer possibilidade ou abertura para diálogo e sim uma imensa má vontade do Congresso Nacional, de uma maneira geral, em dar voz para sindicatos e instituições especializadas na proteção trabalhista”.
“Alertamos várias vezes por meio de notas técnicas, audiências públicas, e o que nós vimos lá, além do mostrengo legislativo aprovado pela Câmara dos Deputados, foi o Senado referendar aquele absurdo sobre a alegação de que o presidente da República iria vetar alguns artigos e trazer, numa medida provisória, a melhoria de alguns dispositivos que ali foram trazidos. O que nós vimos foi um total engodo, onde não foi vetado tipo de dispositivo e a comissão sequer foi instalada para se discutir a Medida Provisória 808. Desde o início nós sabemos que a vontade de grande parte do Parlamento, capitaneador da aprovação da Lei nº 13.467/2017 e extremamente dominado pelo capital, era justamente destruir o direito do trabalho”, disse o presidente da ANPT.
O procurador, porém, falou que o debate sai do campo legislativo e vem para o locus dos operadores do direito do trabalho, que devem interpretar a reforma trabalhista de forma a contemplar uma interpretação conforme os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, assim como direitos previstos em convenções e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, e, por fim, uma interpretação sistemática de todo ordenamento jurídico trabalhista.
Por outro lado, Farias da Costa disse também que as ameaças não terminam por aí, pois existem alguns projetos que tramitam no Congresso Nacional e que também acabam por piorar essa proteção do direito dos trabalhadores. Nesse sentido, ele citou o projeto do novo Código Comercial, que impõem que o Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho, para realizar uma fiscalização, avisem a empresa com 48h de antecedência. “Nosso país é um dos campeões, em acidentes do trabalho e com uma medida como essa, tende a piorar. Esse mesmo código comercial, em mais um ataque à magistratura, traz um dispositivo que limita a penhora online pelo juiz singular a R$ 20 mil reais. Acima disso, somente mediante uma ordem do colegiado, do tribunal, o que fere a independência dos juízes e prejudica a efetividade da execução”, informou.
O palestrante falou também sobre a desconsideração da personalidade jurídica e disse que ela é um tema que também está sob ataque. Segundo ele, existem alguns projetos de lei que visam burocratizá-la. Nesta linha, o procurador disse que deve ser aplicada hoje ao processo do trabalho a chamada teoria menor, aquela do art. 28 do CDC, onde a mera insuficiência do patrimônio é a condição para que possa ser decretada a desconsideração da personalidade jurídica. Ele explicou que o trabalhador muitas vezes fica anos sem receber e sofre na pele a demora e, portanto, não seria necessário que seja comprovada algum tipo de abuso de direito, algum tipo de fraude por parte do sócio ou da empresa, como acontece nos danos ao consumidor.
Ele chamou atenção, ainda, para uma situação que mostra a discriminação entre o processo civil e o processo do trabalho. “A reforma trabalhista trouxe um dispositivo que traz total incoerência com o que é aplicado no processo civil. Caso o trabalhador não seja beneficiado com o cumprimento voluntário pelo devedor do direito reconhecido em decisão judicial transitada em julgado, deveria ter o direito de ter acrescida a multa de 10% naquele seu débito, como determina o Código de Processo Civil para as ações civis na Justiça Comum. Não há sentido nesse tratamento discriminatório”, disse.
O presidente da ANPT falou ainda sobre a questão do protesto, da inclusão do nome do devedor nos sistemas de proteção ao crédito e no Banco Nacional de Devedores Trabalhista, o que, segundo ele, é um meio de coerção indireta para que o empregador cumpra a obrigação que também é tratada de forma discriminatória e diferenciada entre processo civil e processo do trabalho.
Segundo Farias da Costa, “no CPC, terminado o prazo de 15 dias para cumprimento da sentença, o protesto já pode ser efetuado pelo exequente. Porém, no processo do trabalho, pasmem, o legislador previu, na reforma trabalhista, que só após o transcurso do prazo de 45 dias pode ser a decisão judicial transitada em jugado pode ser levada a protesto ou a inscrição em órgãos de proteção ao crédito ou BNDT. Ou seja, o executado tem o prazo de 48 horas para pagar ou garantir o juízo, e, se não o faz, ele tem mais 43 dias desse favor legal que é concedido a ele para que possa ter seu nome escrito em algum tipo de restrição de crédito”, indicou.
Por fim, Farias da Costa disse que o índice de correção monetária dos débitos trabalhistas, a Taxa Referencial, estipulado na reforma trabalhista, é inconstitucional. “Estipular a taxa referencial, que nós sabemos ser uma taxa baixíssima, que não corrige nada, vai totalmente na contramão de decisões em ações diretas de inconstitucionalidade no STF que já determinaram que, nos débitos relativos à Fazenda Pública, o índice a ser aplicado para que haja de fato a preservação do poder aquisitivo daquele débito deve ser o IPCA-E. Acredito que a ampla maioria dos juízes do Trabalho deve afastar a TR por inconstitucionalidade, determinando seja aplicado o IPCA-E”, informou.