Na manhã desta quinta-feira (6/9), o presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Carlos Eduardo de Azevedo Lima, participou de audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (CDH). Sob a coordenação do presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), diversas autoridades abordaram a precariedade das relações de trabalho e discutiram temas polêmicos em tramitação no Congresso Nacional, como os Projetos de Lei (PLs) que regulamentam a terceirização, que institui o código de trabalho e que trata do chamado "simples trabalhista".
Em relação ao PL 4.330/04, que regulamenta a terceirização, o presidente da ANPT ressaltou que, embora seja imprescindível uma normatização que freie a precarização das relações de trabalho, tal como se constata cotidianamente na realidade do trabalho terceirizado, ela não pode acontecer em despeito da garantia de condições dignas de trabalho. É necessário vedar a terceirização para atividade-fim, assim como exigir a responsabilização solidária de todos os integrantes da cadeia produtiva, especialmente no que diz respeito ao meio ambiente do trabalho e às normas referentes à saúde e à segurança dos trabalhadores, reforçou.
Outro ponto levantado pelo procurador diz respeito à necessidade de uma isonomia de direitos entre terceirizados e trabalhadores "efetivos", além do correto enquadramento sindical (levando em conta a categoria profissional do trabalhador), dentre outras questões. O presidente da ANPT explicou, durante a audiência, que em relação à terceirização, em que o foco é diminuir custos, há redução de direitos, jornada exaustiva e descuido com o meio ambiente de trabalho. Esses trabalhadores, consequentemente, ficam mais suscetíveis a sofrer acidentes no local de trabalho. De cada 10 acidentes de trabalho no Brasil, 8 são em empresas terceirizadas, o mesmo percentual se repetindo em relação aos acidentes fatais, já que, de cada 5 mortes, 4 são em empresas terceirizadas. Vale lembrar que, atualmente, segundo ele, mais de 10 milhões de brasileiros são trabalhadores terceirizados.
Azevedo Lima ressaltou, também, que o PL, ao não impor qualquer limitação à terceirização das atividades nucleares da tomadora de serviços, desconhece a realidade da legislação trabalhista e viola dispositivos constitucionais. Não pode haver escolas sem professores, hospitais sem profissionais de saúde, bancos sem bancários, vindo a ser todos trabalhadores vinculados formalmente ao tomador dos serviços, completou ao lembrar que o empregador deve contratar diretamente, ao menos, os empregados que serão responsáveis imediatos pela consecução do empreendimento econômico, ou seja, aqueles alocados na atividade-fim da empresa.
Já sobre a questão da responsabilidade solidária, ele esclareceu que não é difícil de se ver e concluir, agora, na forma da nova regulamentação do Código Civil brasileiro, que a responsabilidade por ato de terceiro é objetiva e solidária . O fato gerador da responsabilidade é inerente aos próprios riscos da atividade, que não podem ser repassados a outros, muito menos aos trabalhadores enfatizou.
O representante da ANPT ressaltou, ainda, que é importante inserir no substitutivo ao PL a adequação do enquadramento sindical, para viabilizar a organização dos trabalhadores e a luta por seus direitos e garantias, "o que acaba não ocorrendo quando se reúne numa mesma entidade trabalhadores que não têm nenhum senso de unidade por desempenharem funções as mais distintas, tal como se dá nos chamados 'sindicatos de trabalhadores de empresas prestadoras de serviços terceirizáveis'", exemplificou.
Já sobre o Projeto de Lei 951/2011, que institui o Programa de Inclusão Social do Trabalhador Informal, também conhecido como Simples Trabalhista, Azevedo Lima ressaltou que não há como deixar de concordar com a necessidade de combater a informalidade no mercado de trabalho, mas isso não pode acontecer por meio da subtração de direitos historicamente reconhecidos aos trabalhadores, subtraindo-os justamente do lado mais fraco da cadeia produtiva, além de criar trabalhadores de segunda ou terceira categorias, que, com base no texto do projeto, passam a ter seus direitos aviltados com respaldo na própria legislação, disse.
Entre as críticas apresentadas pelo presidente da ANPT ao projeto - o qual, segundo ele, traria incontáveis prejuízos aos trabalhadores - destacam-se as questões concernentes à redução dos depósitos do FGTS para 2%, a fixação de horário normal de trabalho do empregado durante o gozo do aviso prévio, o parcelamento do 13º salário em até seis vezes, o fracionamento das férias em até três períodos, a redução do intervalo intrajornada, a supressão do pagamento de horas extraordinárias. Ressaltou, também, que há vários dispositivos que favorecem, nitidamente, a ocorrência de fraudes, como a possibilidade de contratações por prazo determinado de forma indiscriminada, a falta de assistência do sindicato na rescisão do contrato de trabalho e a utilização da arbitragem na solução de dissídios individuais.
Sobre o PL que institui o código de trabalho, de autoria do deputado Silvio Serafim Costa (PTB/PE), e para cuja análise ANPT formou uma comissão de estudos voltada a analisar profundamente o PL, Azevedo Lima disse que ele, sob o pretenso pretexto de minimizar os custos empresariais para competição comercial, flexibiliza a legislação trabalhista nacional, ao incluir empregados mais baratos no mercado de trabalho. Em síntese, o código de trabalho previsto no projeto pretende que o contrato individual de trabalho seja regido pelas regras estabelecidas pelas próprias partes, negociado sobre o legislado, tornando possível a supressão de direitos previstos na lei, enfatizou.
Por fim, o presidente da ANPT disse que o PL foi um projeto apresentado sem debate com a sociedade, sem levar em consideração o que pensam as entidades associativas, a sociedade civil, centrais sindicais e o próprio governo. Um projeto dessa amplitude precisaria de discussões muito maiores", enfatizou. A audiência pública promovida pela CDH, segundo ele, ao passo em que convida a reflexões e debates acerca de questões específicas, tem um objetivo ainda maior, que é tratar do combate à precarização nas relações de trabalho e, principalmente, de projetos em tramitação no Congresso Nacional que têm nítido viés precarizante. "Estejamos atentos e acompanhemos diuturnamente a tramitação desses e de outros projetos de cunho semelhante, a fim de que evitemos que a realidade hodiernamente constatada de precarização, que já é grave, torne-se ainda pior, finalizou.